Postado em 09/07/2019 09:26 - Edição: Marcos Sefrin
Nos últimos três anos, a classe trabalhadora e, de forma mais geral, o povo brasileiro passaram a encarar no seu dia a dia uma questão que não enfrentavam havia muito tempo: o aumento do valor e da volatilidade dos reajustes do diesel, da gasolina e do gás de cozinha. Confira o encarte especial da edição 144 sobre o tema.
Nos últimos três anos, a classe trabalhadora e, de forma mais geral, o povo brasileiro passaram a encarar no seu dia a dia uma questão que não enfrentavam havia muito tempo: o aumento do valor e da volatilidade dos reajustes do diesel, da gasolina e do gás de cozinha.
O marco dessa tragédia foi a chegada à presidência da Petrobras do ex-ministro do governo Fernando Henrique Cardoso, Pedro Parente. O novo presidente, logo após assumir a gestão da companhia, colocou em prática uma política de preços cujo parâmetro de reajuste era o valor do barril internacional do petróleo ponderado pelos custos de transporte e taxa de câmbio. E mais: além de tomar como referência o preço internacional, Parente impôs uma frequência muito maior nos reajustes de preços, que chegaram a ocorrer diariamente. Além da nova política de preços, a Petrobras diminuiu sua produção de refino forçando a entrada de produtos importados. A crença era de que a concorrência poderia jogar o preço da gasolina, do diesel e do gás cozinha lá embaixo.
O resultado, todavia, foi diferente. O que se viu foi a população brasileira passando a sofrer todos os dias com a volatidade dos preços internacionais, em função da dinâmica do mercado financeiro global e da geopolítica do petróleo. O que isso significou?
Significou que, a cada conflito no Oriente Médio, decisão de cortes de produção dos grandes fabricantes globais ou turbulência no mercado financeiro internacional em que o preço internacional do petróleo fosse impactado, o Brasil passou a internalizar esses impactos nos seus reajustes. No português claro: a decisão de cortar a produção da Rússia ou um boicote dos Estados Unidos ao Irã podem aumentar “de uma hora para outra” o preço internacional do petróleo e, por consequência, elevar o preço do diesel, da gasolina e do gás cozinha no Brasil. Ou seja, por conta de tensões globais ou mudanças estratégicas dos grandes produtores de petróleo, a dona de casa é obrigada a comprar gás de cozinha por um valor mais alto no país.
Apesar da política insensata, a Petrobras colocou o pé no acelerador e a manteve a despeito dos alertas de especialistas e dos próprios trabalhadores, como nós, petroleiros. No entanto, somente uma medida drástica foi capaz de fazer a Petrobras enxergar a insanidade que vinha cometendo: as greves! Primeiro dos caminhoneiros e depois dos petroleiros.
Os impactos das greves foram deletérios à sociedade brasileira, mas apenas dessa forma foi possível forçar o governo e a Petrobras a enxergar o óbvio: a política de preços da gestão Parente era inviável. Rapidamente, o governo e a Petrobras mudaram sua postura e buscaram criar instrumentos para lidar com a confusão que haviam criado. Nesse sentido, o governo criou um programa de subsídios à comercialização do diesel e zerou a Cide; a Petrobras, por sua vez, rapidamente aumentou a carga das suas refinarias.
Mesmo com a evidência de que foi a política da Petrobras e a completa passividade do governo que resultaram nas greves, iniciou-se uma disputa de narrativas sobre as origens do aumento do valor e da volatilidade do preço do diesel. Alguns liberais colocaram a culpa nos impostos; outros, nas políticas de estímulo aos caminhoneiros, afora aqueles que insistem que o problema é o monopólio da Petrobras no setor de refino.
Mesmo quase um ano depois da crise, essa disputa de narrativa continua, ainda mais porque a diretriz atual da Petrobras, de forma geral, mantém a política da gestão Parente e o ministro Paulo Guedes abandonou as iniciativas anteriores que ajudaram a controlar os preços do diesel. E, se como isso não bastasse, o ministro e o novo presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, retomaram o programa de privatizações das refinarias da Petrobras de forma mais perversa. Foram colocadas à venda sete refinarias, mais a Unidade de Xisto do Paraná, que, caso se concretize, diminuirá a capacidade de refino da Petrobras em mais de 1 milhão de barris por dia.
Não por acaso, ainda no primeiro trimestre deste ano estivemos à beira de uma nova greve de caminhoneiros no país.
Visando apontar uma narrativa distinta daquela apresentada por parte dos especialistas liberais, a Federação Única dos Petroleiros (FUP), junto com o Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) e com o Le Monde Diplomatique Brasil, encaminhou a elaboração deste encarte, composto por textos de acadêmicos, pesquisadores do Ineep e outros atores do setor petróleo que partem de uma visão distinta a respeito do problema dos preços no Brasil. Eles reconhecem a importância da questão dos impostos e os problemas com os postos de gasolina, mas deixam claro que está na atuação da Petrobras e, em última instância, do Estado nacional a origem da crise dos preços da gasolina e do diesel no Brasil.
Todavia, este encarte não trata apenas do diagnóstico da crise dos preços, mas também se preocupa em comparar o caso do Brasil com o de outros países, bem como procura apresentar alternativas para tornar a gestão menos volátil no país.
Essa iniciativa marca um esforço da FUP e dos seus parceiros em mostrar a relevância da Petrobras para o Brasil e exibir uma visão diferente daquela difundida pelos grandes meios de comunicação e por parte dos especialistas do Brasil de que a Petrobras e o Estado brasileiro seriam os problemas para os preços dos combustíveis. Como será visto ao longo dos textos apresentados, a questão é exatamente oposta: sem o Estado nacional e a Petrobras seria extremamente difícil lidar com a volatilidade e o aumento dos preços do diesel e da gasolina no Brasil.
José Maria Ferreira Rangel é coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP).
Matéria feita por José Maria Rangel
Ref.: https://diplomatique.org.br/
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