Postado em 26/02/2019 21:31 - Edição: Bruno Wisniewski
Não há em nenhum livro da codificação espírita qualquer menção ou condenação ao Carnaval
OS BLOCOS GANHAM AS RUAS DO PAÍS (FOTO: ABR)
Confetes, serpentinas, instrumentos musicais, risadas, abraços demorados, malas enormes e colchonetes espalhados pelas salas. Nas paredes da universidade, além de cartazes de boas vindas e frases de autoajuda, sinalizações direcionavam para a ala masculina e a ala feminina.
Foi assim em quase todos os carnavais da minha adolescência e juventude na década de 1990, em um retiro espiritual para jovens espíritas. Cerca de 800 participantes a se revezar na cozinha, na limpeza, na animação, nos estudos e na harmonização do ambiente. Fui muito feliz durante esse período. Era uma vivencia genuína da fé.
Para muitos de nós, aquele “carnaval cristão” servia para experimentar um outro tipo de alegria, uma outra vivência do amor, embora muitos, na época, reprimíssemos nossos desejos.
Todos éramos chamados a viver e a aproveitar o tempo do Carnaval, que é época de festejar, com a alegria própria que o momento recluso proporcionava.
Há quem prefira extravasar, há quem prefira encarar uma maratona no Netflix e há aqueles que preferem se retirar, inclusive participando de encontros religiosos como esse descrito acima. Tá tudo bem para todo mundo.
O que não é legal é demonizar a alegria dos outros, padronizar corpos e utilizar-se de preconceitos judaico-cristãos – que não tem nenhuma relação com a doutrina espírita – para reprimir(-se).
Equivoca-se profundamente quem acredita que o mundo deve ser visto apenas pela sua própria ótica. Há várias maneiras de ver o mundo e o seu ponto de vista é apenas mais um.
Durante muito tempo fui levado a crer, por uma lógica punitiva utilizada por alguns dirigentes espíritas, que carnaval era uma festa profana, perturbadora. Nesses períodos, espíritos inferiores aproveitavam para incitar orgias, uso de drogas e violências. Como se eles não pudessem fazer isso nos outros dias do ano, inclusive no recente período eleitoral.
Nos aproximamos, por afinidade, daqueles que vibram na mesma faixa que nós, tanto vivos quanto mortos. Ou vocês acham que quem faz arminha com a mão ou que deseja exterminar seus opositores está inspirados pelos espíritos superiores?
Muitos centros espíritas não funcionam durante as festividades de Carnaval, uns dizem que é por que as equipes espirituais trabalham em socorros externos e outros por que as energias são tão densas que exigem um recolhimento dos espíritas.
Não é incomum ver espíritas se referirem aos foliões como “delinquentes”, “marginais”, “depravados”. Claro, não são maioria, mas, canonizados por uma parcela de adeptos do espiritismo, acabam por ter uma amplitude maior de suas ideias preconceituosas.
Em tempos de redes sociais, esses “gurus” conseguem ter um alcance maior e seus ódios, travestidos de amor cristão, influenciam ainda mais fiéis.
Embora o povo brasileiro, historicamente festivo e alegre, tenha tornado o Carnaval uma festa brasileira e ser considerado a maior do mundo, ele chegou ao Brasil somente no século XVII, por meio das festas que ocorriam na Europa, principalmente na Itália e na França, explicando com isso a introdução de pierrôs (pierrot) e de colombinas nas fantasias locais.
São quatro dias de festas que precedem a quarta-feira de cinzas. As etimologias mais populares afirmam que a palavra vem da expressão latim carne vale, que significa “adeus à carne”, significando o período de jejum que se aproxima com a quaresma.
A expressão carne levare do italiano é uma possível origem, que significa “remover a carne”, uma vez que a carne é proibida durante a Quaresma.
A Quaresma é um período de 40 dias, entre a Quarta-feira de Cinzas e o Domingo de Páscoa, observado pela igreja católica e por algumas protestantes como época de abstenção e jejum.
Não há em nenhum livro da codificação espírita qualquer menção ou condenação ao Carnaval. Quem o faz, age a partir de suas próprias interpretações, vivências e visão de mundo, o que, inclusive estou fazendo.
Alguns espíritas, mais tradicionais e que viveram em períodos mais remotos da história, condenam o Carnaval por que viveram um despertar espiritual marcado pela percepção dos próprios excessos, ou tiveram experiências religiosas de plena interdição ao corpo, optando pelo celibato ou clausura.
Devemos lembrar que no Carnaval, como em qualquer outra festa e aglomeração, há, também, gente mal intencionada.
Brinquemos o Carnaval, respeitando os desejos e os corpos dos outros. Não é não e ninguém deve ser obrigado a fazer algo que não queria.
Racismo, machismo e LGBTfobia não combinam com o Carnaval.
Matéria feita por Franklin Félix dia 25 de fevereiro de 2019
Ref.: https://www.cartacapital.com.br
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