Postado em 17/07/2018 18:22 - Edição: Marcos Sefrin
O deputado do PMDB, que tentou indiciar Janot e dançou para celebrar a salvação de Temer, assume a articulação política do Planalto
Marun fez sucesso como integrante da "tropa de choque" de Cunha
O presidente Michel Temer deu posse nesta sexta-feira 15 a seu novo ministro da Secretaria de Governo, órgão responsável pelas negociações políticas entre o Palácio do Planalto e o Congresso. O escolhido é Carlos Marun, deputado eleito pelo PMDB-MS e que se notabilizou por ser um defensor de primeira ordem de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ex-presidente da Câmara cassado por mentir aos colegas a respeito de contas na Suíça e condenado por corrupção na Operação Lava Jato.
Cunha está preso no Paraná e, ao contrário da expectativa, não fez um acordo de delação premiada que poderia incriminar Michel Temer. Em novembro, em embate com o doleiro Lucio Funaro, apontado como operador financeiro do PMDB em esquemas de corrupção, Cunha inclusive defendeu Temer. Agora, seu antigo escudeiro chega ao primeiro escalão do governo.
Sem Cunha no cenário, Marun se tornou um ferrenho defensor de Temer e se notabilizou por dois fatos recentes. No início desta semana, ganhou as manchetes ao pedir o indiciamento de Rodrigo Janot, ex-procurador-geral da República que denunciou Temer, na CPI da JBS. Mais tarde, recuou para que o relatório do colegiado fosse aprovado.
No fim de outubro, definida a votação em que a Câmara salvou Michel Temer de uma denúncia por formação de quadrilha e obstrução da Justiça, o deputado não conseguiu esconder sua alegria. Em frente a jornalistas, dançou e cantou. "Tudo está no seu lugar. Graças a Deus, graças a Deus. Surramos mais uma vez essa oposição, que não consegue nenhuma ganhar."
Marun vinha atuando em posições estratégicas.
Foi vice-líder do governo e também presidente da comissão especial de reforma da Previdência, onde se discutiu um dos carros-chefe do Planalto no Legislativo.
Atualmente, vinha atuando como como vice-líder do PMDB
Após a votação da denúncia contra Temer, Marun foi o porta-voz da linha-dura que o governo prometia adotar com quem votou contra o presidente. "Os deputados que votaram contra o presidente devem ser excluídos da base e ser tratados como oposição. Não devem ser nem recebidos pelos ministros", afirmou. Agora, o próprio Marun será o responsável por essa articulação, no lugar de Antonio Imbassahy (PSDB-BA), que volta para Câmara.
A postura de escudeiro não é estranha a Marun. Só que antes de proteger Temer, quem estava na posição de soberano era Eduardo Cunha. Ao longo de 2015, quando o então presidente da Câmara, hoje preso, atuou para inviabilizar o mandato de Dilma Rousseff, Marun esteve ao seu lado.
Defendeu o desembarque do PMDB do governo, o impeachment e participou de manifestações de rua contra a petista em Campo Grande, capital do seu estado. No ocaso de Cunha, alvo de pedido de cassação por mentir à Câmara, Marun não o abandonou. No Conselho de Ética, trabalhou para anistiar o colega e, na sessão que culminou com o expurgo de Cunha, foi um dos nove deputados que votaram contra a cassação, sendo o único a defender o correligionário em plenário.
A prisão de Cunha não afastou os dois. Na véspera do Natal de 2016, o deputado sul-mato-grossense usou verba da Câmara para visitar o colega cassado no Paraná, onde está preso por ordem de Sergio Moro. Após a revelação do escândalo, Marun prometeu devolver os 1,2 mil reais que usou na visita natalina.
Com a saída de Cunha de cena, Marun tornou-se automaticamente um defensor do governo e de Temer. Era atualmente relator da CPI da JBS. O fato de Marun ter recebido, nas eleições de 2014, 103 mil reais em doações do frigorífico (50 mil por intermédio da senadora Simone Tebet e 53 mil por meio de Nelson Trad Filho, ex-prefeito de Campo Grande), não foi empecilho para ele obter a posição. A CPI da JBS é vista nos bastidores como foro ideal para que a delação de Joesley Batista e outros executivos da gigante fabricante de proteínas animais seja anulada.
Em novembro, o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot fez duras críticas ao colegiado. Disse que "os maus políticos que tomaram conta dessa investigação parlamentar desviaram totalmente seu foco e estão mais interessados em fazer a 'CPI do MPF'" e que "pretendem debilitar os ex-investigadores".
Uma eventual anulação da delação seria um alívio para Temer e Cunha. Na denúncia que foi barrada em outubro pela Câmara, Temer era o protagonista, mas Cunha tinha um papel relevante. Segundo Janot, Temer lidera uma organização criminosa formada pelos ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral), além de Cunha e dos também ex-deputados Geddel Vieira Lima (BA) e Henrique Alves (AL), ambos também presos.
Das investigações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, depreende-se que Cunha e Temer eram (são?) aliados e tinham em seu entorno uma série de deputados escudeiros, que em troca receberiam ajuda antes, durante e depois das eleições. Temer e Cunha tinham hierarquia semelhante no grupo, escreveu a PF em um relatório, mas o presidente tinha "a função de conferir oficialidade aos atos que viabilizam as tratativas acertadas por Eduardo Cunha, dando aparente legalidade e legitimidade em atos que interessam ao grupo."
A conclusão dos investigadores vai ao encontro de acusações feitas abertamente por alguns políticos, como o ex-ministro Ciro Gomes, segundo quem a aliança teria uma natureza ilegal. "Na verdade, Temer é o homem do Cunha, e não o inverso. Parte importante das loucuras que faz é por estar completamente comprometido", afirmou Ciro ainda em dezembro de 2015 a CartaCapital.
Contra Marun, nada pesa nas investigações da Lava Jato. O deputado tem, entretanto, seu próprios rolos. Nascido em Porto Alegre, Marun fez sua carreira política em Mato Grosso do Sul. Foi vereador de Campo Grande e deputado estadual. Depois, secretário estadual de Habitação e presidente da Agência de Habitação Popular de Mato Grosso do Sul (Agehab), cargos que exerceu no mandato do governador André Puccinelli, que hoje usa tornozeleira eletrônica por ser investigado por fraudes em licitações e desvios de dinheiro público.
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Por conta de sua atuação no último cargo, Marun é alvo de um processo por improbidade administrativa. Desde 2013, é acusado de beneficiar a DigithoBrasil Soluções em Software Ltda., que prestava serviços à Agehab, em contratos de 16,6 milhões de reais. "Estou me defendendo, tenho certeza de que o processo resultará na minha absolvição”, afirmou Marun recentemente ao jornal O Estado de S. Paulo. A empresa também alega inocência.
O fato de ambos, deputado e empresa, serem acusados de desvio de dinheiro público não provoca constrangimento. Nas eleições de 2014, a DigithoBrasil foi a principal financiadora da campanha de Marun – bancou 300 mil reais do 1,6 milhão de reais arrecadado.
Outras empresas com problemas judiciais também doaram ao escudeiro de Cunha e Temer. A H2L Equipamentos, cujo dono, Rodolfo Pinheiro Holsback, foi investigado na Operação Lama Asfáltica, investiu 145 mil reais no deputado; a Guizardi Júnior Construtora, cujo dono, Giovani Guizardi, é réu e delator da Operação Rêmora, bancou outros 20 mil reais.
*Uma versão deste texto foi publicada originalmente em 26 de outubro, antes da nomeação de Marun
Matéria feita por José Antonio Lima — publicado 15/12/2017 15h55, última modificação 15/12/2017 15h55 - foto de Marcelo Camargo / Agência Brasil
Ref.: https://www.cartacapital.com.br
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